directamente para os cânones da BD punk
spoiler alert se não leste o livro mas vais ler, pára por aqui...
ie: KARMA Punks
Não é uma BD particularmente competente no seu traço se nesse procuram algum virtuosismo técnico desprovido de alma. Não é igualmente uma obra a conquistar públicos crédulos que a perscrutem à luz de comparações banais e batidas. Mas arrebatou-nos.
Em parte os P+ persistem e resistem e retorno sempre a eles porque são a BD que gostaríamos de ler mas não encontramos em mais lado algum - um vazio que exige fazer-se cumprir de algum modo. Tivéssemos porventura descoberto esta BD nos seus anos de publicação e os P+ poderiam nunca ter existido.
Diz-nos a literatura que o autor começou a editar em 1994 com os Filth, «a series of ferocious guerilla attacks on the complacent hypocrisy of that decade..." “a vehicle for personal catharsis - an angsty outlet of disillusionment and dumb-ass, punk rock attitude", publicados em sete números com o último a sair em 1997. Entre 2001 e 2003 regressa com Dharma Punks, "an epic“ com "punks, existentialist anarchists, skinhead neonazis" que se desenrola inteiramente no decurso de uma só noite.
Entre a sobreposição de temas à época (1997-2003) e novamente nas coincidências às nossas mais recentes lamúrias das últimas semanas (aqui, aqui e aqui) não conseguimos deixar de pensar que é karma. Fora a óbvia qualidade da BD que o autor procura manter acima de um limiar de legibilidade e que n’OS POSITIVOS não nos importa-, os paralelismos são vários e pese as inúmeras diferenças que separam os P+ dos Punks encontramos nestes mais semelhanças do que as que podemos revelar. E não obstante a simultaneidade dos temas, o que mais nos arrepia é como esta peça regressa de uma hibernação de décadas justamente nas semanas em que recordamos outros –esses!- tempos e atitudes, falamos de música, punk, Kurt C e tangencialmente e despropositadamente até de animação: o Ant é hoje um animador profissional, a sua BD transpira cultura punk com conhecimento de causa, o Cobain é presença inconstante mas fundamental e toda a história arrasta-nos sem dó de regresso a vidas passadas. E meta-ironia com a nossa descoberta e experiência da obra na ocasião em que ocorre, a narrativa dos Punks é uma revisão do protagonista do seu próprio passado a partir de um futuro/presente. Karma.
O Ant mantém a sua história no inteligível a cada passo, nós não nos coibimos de descer ao incompreensível na primeira ocasião - os P+ são uma versão punk d.i.y dos Dharma Punk, os Dharma Punk são uma versão profissional e cuidada do que os P+ não podem ser. E ambas são histórias de redenção, com as respetivas diferenças: nós matámos o nosso protagonista, ele matou a amada do seu. É uma possível diferença entre uma BD demasiado pessoal e uma que procura manter-se no limiar do acessível: pelo suicídio daquela que ama, o protagonista dos Punks conseguiu a sua redenção. Com a morte do nosso protagonista, trouxemos paz àqueles que este ama.
he understands