Um quick recap do fds para os mais distraídos.
- Sexta-feira: artsy, punx, $$$, diy, digital, web, emancipação, tudo com a desculpa de métodos de impressão.
- Sábado: ainda o fetiche do papel, que nos devolve a temas com que nos enredamos desde finais do ano passado. $$$, manipulação, acção, media, e repete também emancipação, com nota a recordar um Freud porque outras coisas nos importam ainda.
- Domingo: $$$ e BD, que podem entender na nossa crítica mais geral à bastardização da acção em prol da arte e do guito, onde facilmente se descortina a subordinação da primeira à segunda, com o bónus de o fazermos demonstrando o filtro do digital na comunicação em duas frentes: transformação de sentido e inadequação ao meio.
Façam uso da vossa bagagem em P+ para desenvolver além do aqui resumido no nosso sumário.
Tin foil hats, if u please,
I
Estamos a chegar ao fim do Barzun e a começar novo calhamaço cuja existência desconhecíamos de todo antes de lhe deitarmos mãos em cima. Da primeiríssima página deste:
Should Schopenhauer’s dictum from the 19th century, that we should approach a work of art as it if were a prince, still apply even in the 21st century? Should art be approached submissively, and supported by academic disciplines that understand themselves to be keepers of the knowledge of the elite?
in Alexander Braun fev 2017
Séculos 19 e 21 na mesmíssima frase, com arte submissa, academia e outras elites? Familiar, quer o time travellin' quer o tema. E recordam-se como andamos a protelar sobre autenticidade nos comix/punx agora que chegamos nas nossas teses ao estágio dos media desacreditados, popularizados, e arte das massas? Well-nigga-please:
Auratic gestures like these, in fact, are more successful when one is faced with unique works of art that are owned by an individual and can be ceremoniously borrowed and displayed. In this light, the comics genre would already be disqualified simply due to its high level of circulation. Winsor McCay's comic strips were consumed on weekdays, and, in particular, on Sundays, in the major American "yellow press" daily news-papers, by millions of people: an almost outrageous act of democratization of art; pure anarchy in the age of technical reproducibility!
in Alexander Braun fev 2017
Têm a nossa atenção, e vcs já sabem como funciona o processo: há que encontrar relações onde estas só podem ser acidentais. Regressando então ao início do fds: risografia e técnicas de impressão? Conseguirmos embrulhar algo de relacionado à conversa para fazemos a ponte com democratização, emancipação, populismos, fim de elites e hierarquias, talvez alguns pós de $$$ e ainda um pontapé no cu à arte (burguesa), e de modo a incorporar na nossa tese sobre o papel de comics em digital nos media?
Basta continuar o mesmíssimo parágrafo onde o deixámos:
The best rotating printing presses in the country, capable of creating brilliant four-color prints, were not being used to create exhibition catalogues for the bourgeois art market but to supply millions of readers, including uneducated workers and immigrants, with pictures - pictures they could own for the price of a newspaper (just a few cents). These magnificent pages thus became the property of the readers, regardless of their social standing or background, with no trace of traditional hierarchies, "gracious displays," or grateful viewers "just looking."
in Alexander Braun fev 2017
Surreal. E agora entramos na loucura. Destes excertos anteriores, espaço para a crítica da arte por via da indústria da cultura:
However, does the culture industry discredit a work of art simply based on its affiliation with a specific genre or because of its high level of circulation?
in Alexander Braun fev 2017
E nessa crítica todos os alarmes soam quando a propósito de oportunidades falhadas e multimédia –hint hint- deixam cair a palavra:
In this way, the exhibit missed yet another opportunity, namely that of highlighting the beginnings of pictorial mass media, which significantly inspired Surrealism in its combination of painting, photography, and film.
in Alexander Braun fev 2017
Ladies & gents: tha shit hits tha fan, and tha fans, as the crowd goes wild! Porque estivemos aqui há poucos posts atrás.
II
Lembram-se quando falávamos de demónios? Registámos este parágrafo - entre outros – na altura:
Desta maneira, o artista individual, ao não ser responsável em nenhum sentido, está realmente acima da crítica.
in Barzun
Na continuação do parágrafo, temos contacto:
O dadaísmo, o surrealismo e as suas sequelas tiveram como consequência uma democrática ampliação dos termos arte e artista.
in Barzun
Shit u not. Não que precisássemos mas os deuses da ironia e sátira dão-nos assim uma clara aprovação ao passar de testemunho de leituras, e se fizeram questão de salientar o tópico, arquivemos para a posteridade o que nos diz o livro que se fecha:
Evidentemente, os melhores discípulos do surrealismo fizeram mais que beber desse lago subterrâneo feito de associações guiadas pelo instinto e, em consequência da tendência que imprimiram às suas produções, a palavra surrealista adoptou um significado mais restrito, que é agora o único em uso: qualquer coisa que causa consternação por ser contrária à experiência comum.
in Barzun
Destaques todos nossos, e qualquer coisa naquela consternação nos chama. Poderemos elucidar, ou, pelo menos, algo mais acrescentar? Podemos complicar, também este nos merece segunda leitura:
Mas a aposta ganhadora, o toque ultramoderno, ficaria a dever-se a Duchamp (...) O temperamento discordante de Duchamp tinha-se manifestado já antes da guerra, fruto de uma insatisfação consigo próprio e com os outros artistas. (...) A profunda influência que exerceu sobre os seus contemporâneos e sucessores procede de (...) ter pintado um bigode numa reprodução da Mona Lisa. A junção destes dois poderosos símbolos representava a negação do Renascimento e suas sequelas; era equiparável às realizações do dadaísmo. A construção chegara ao fim e o seu contrário tinha começado.
in Barzun
Estas brincadeiras eram sérias e como tal deviam ser tomadas. De facto, ajudar a destruir uma cultura não é brincadeira nenhuma se aquele que a faz tiver talento e destreza técnica que deve subjugar para os concerter numa espécie de REDUCIONISMO, em vez de lhes dar rédea solta para se expandirem. Outros artistas encontraram meios menos exigentes e mais directos par contribuirem para o esforço comum.
in Barzun
Poderíamos ficar por aqui, pedir-vos para reler novamente a citação anterior e remoer nela -e, por quem sois, façam-no: deixem-na ecoar quanto tempo for necessário até ela desvanecer para cantos recônditos do subconsciente - mas vcs conhecem-nos bem demais por esta altura.
Três é um número mágico, a nossa adivinhação do cosmos precisa de pelo menos outra correlação. Cue a entrada para o super-spooky muthaload de todas as “coincidências”. Termina o Jacques B.:
Dadas as diversas manifestações da arte modernista é lógico concluir que a produção de coisas para ver ou ler não é um dom raro ou especial. Trata-se de um populismo que alcança todos, ou quase todos. Em primeiro lugar, alguns dos géneros como a arte encontrada não implicam um estudo prolongado ou muita prática. Em segundo lugar, a pouca importância dos temas elimina a necessidade de dar à obra uma verdade psicológica ou de outro tipo. Por outras palavras, a procura de génio extinguiu-se.
in Barzun
Não só o excerto assim tresanda a matérias caras aOS POSITIVOS, como termina na procura do génio. Génio, génio... onde ouvimos esta recentemente? Obviamente, não faríamos a pergunta não tivéssemos já a resposta. O nosso post já mencionado de onde retiramos as citações que nos fazem a ponte à loucura de hoje começa com António Guerreiro: quem quer arriscar o tema da sua crónica desta sexta-feira?
III
De título “O Génio Calado” e entre citações tão sumarentas como –
quanto mais aumenta a necessidade social de estupidez, mais cresce o entusiasmo colectivo pelo Génio
- diz-nos A-to-tha-G que:
A maior parte das pessoas morre sem conhecer o seu Génio, poucas são as que têm o terrível encontro com o Génio e menos ainda as que a ele se entregam sem qualquer resistência, como ele exige. Dizem os estudiosos destas matérias geniais que defraudar o seu Génio é um motivo de infelicidade para toda a vida.
in António Guerreiro 17 fev 2017
Um mashup da coabitação possível:
Um Eu que tem uma vida que não lhe pertence inteiramente, já que tem de partilhá-la com um ser que não conhece, mas com o qual vive em intimidade.
Um homem pequeno e embrulhado em si, à beira de soçobrar ante o peso do Génio. Outros escritores e artistas, tendo-se encontrado com o seu Génio, dão ares de quem recebeu um prémio a que mais ninguém tem direito e estão muito orgulhosos por exibi-lo. Não assim, com António Lobo Antunes: o prémio parece também um castigo.
É evidente que a co-habitação com este inquilino que se apoderou da parte mais importante da vida do escritor não é nada fácil e provoca uma tensão entre duas forças: entre a força impessoal do Génio e a fraca força do Eu, que vai definhando.
Daí, esta confissão: “Não me é fácil viver comigo. Parece que estou sempre em guerra civil.”
in António Guerreiro 17 fev 2017
Freud explica. As coicidências de leituras e temas são-nos avassaladores. Fechemos com Barzun então, no que poderá ser a nossa despedida deste agora que chegamos ao seu fim. No tópico do Freud e arte:
Em consequência, surgiram em abundância por todo o mundo ocidental os museus, galerias, oficinas, exposições de rua, assim como programas governamentais ou subvencionados por empresas para expor, vender e exportar como propaganda a crescente massa de obras de arte. Este florescimento não ocorreu apenas nas grandes cidades, mas também em cidades e vilas mais modestas. Estes novos centros artísticos foram secundados por escolas, hospitais e outros espaços que passaram a acolher a arte das crianças, a arte dos deficientes físicos ou mentais, a arte dos presos, a arte dos chimpanzés. A arte revelou-se também adequada corno terapia e como meio de acalmar os insubmissos nas prisões ou centros psiquiátricos.
in Barzun
E tudo de uma só vez para terminar.
Nos géneros que implicam um maior grau de premeditação, o espectador apercebe-se frequentemente de que tem de estar mais familiarizado com a grande tradição para poder apreciá-los. O pastiche e a paródia não podem deixar de ser artes alusivas que perdem o sentido quando se desconhece o alvo.
in Barzun
in Real Nós.