Não, não nos referimos ao concerto. Punk é livros, agora que estes são do contra - e por contra não nos referimos ao conteúdo: é mesmo a sua existência que faz deles um acto de rebeldia contra qualquer lógica racional. Brincamos, vocês sabem que nós gostamos de livros, certo? Any-ho, Marcos Farrajota promete-nos apontamentos de várias leituras no tópico de "ser do contra", que iremos obviamente acompanhar: quem sabe se nos descobre um livro que nos baralhe as leituras empilhadas para o verão.
Do seu primeiro set de apontamentos, este sobressai:
O pior, é que nada é dito COMO desobedecer não que um gajo queira uma cartilha de (des)obediência mas pelo menos entender o que fazer num cenário tão complicado em que vivemos.
in "Livros do contra" 10 jul 2017
Faltou a vírgula a seguir ao desobedecer. É uma questão de PT, mas também porque vale sempre a pena a pausa, momento de reflexão para avaliar e decidir próximo passo, especialmente quando mais que provavelmente se insistirá na postura do "não!" logo depois do break. E, de "break" em todos os sentidos. Os vândalos que nos leem sabem a resposta à pergunta, uma que muito custa a qualquer pequeno-burguês que a desaprove.
♪ And fuck them Uncle Toms who call police because we smacked 'em
♪ And fuck you sympathizers with your middle class reactions
♪ Cus we bangin on the system G'ed up, fuck the factions
Esta é uma função instrumental à sociedade que nem sequer se pauta pela novidade mas pela recorrência. Continuamos, obviamente, a falar de actos de rebeldia contra qualquer lógica racional - mas, não é essa a sua força? E, como dissemos, nem sequer original, mas uma travestia (*) com séculos em cima. Destaques nossos:
* "Travesti" com "tragédia".
Num universo em que os contrastes de riqueza se acentuam e as tentações aumentam, surgem também atitudes de contestação dos adolescentes face às autoridades e aos notáveis bem instalados. Não se trata dos mais miseráveis nem de vagabundos sem esperança, antes rapazes do povo que pensam estar mal servidos e que sofrem com o reforço das tutelas morais e sociais que pesam sobre eles. A justiça não se engana. Face a estes novos desafios que deslocam para os bens o nó do conflito simbólico entre as novas gerações e os adultos, ela reage multiplicando exemplos de punição suprema. O roubo simples ou, para os criados, o facto de roubar a mais pequena coisa ao seu senhor, mesmo que seja um lenço, pode levar à forca. A nova lição educativa dada a todos os filhos é de não se opor à lei dos pais, de não procurar subverter a ordem comum das coisas ao apropriar-se do que não lhe pertence, mas ter o seu lugar, trabalhar e obedecer para aceder um dia à posição esperada. "Industry and Idleness" [O Zelo e a Preguiça], uma célebre sequência gravada em 1747 por Hogarth, prolonga a prevenção cruel. Mostra que o aprendiz vicioso e preguiçoso acaba pendurado numa forca de Tyburn, enquanto o seu camarada industrioso, respeitador das normas, se torna presidente da câmara de Londres.
in "Uma História da Violência - Do final da Idade Média aos nossos dias" 2014
Valha-nos a consciência do gesto: o tempo está contra o vândalo, este tem que conseguir quebrar o ciclo antes de se acomodar. A sociedade todos assimila e uns poucos expurga: usa o tempo que tens. OS POSITIVOS: a consciencializar teens.
Historicamente, uma batalha perdida. OS POSITIVOS: ninguém nos acuse de optimismo. Sabemos que já perdemos - mas é por isso que não nos podem parar. Cheer up, essa é também, por via da sua natureza, das poucas manifestações que ainda se fazem temer, a sua irracionalidade é a sua força: o que não pode ser constrangido não pode ser comprometido.
No tópico de comprometido, ainda não nos decidimos como entender uma peça como a que está na origem do concerto: por um lado, a validade do registo, por outro, este não é um movimento que olhe para trás e muito menos dado à sua glorificação. Excepto. No momento que transita à passagem de testemunho. Agridoce: implica um declínio, mas também um renovar.
E no tópico de passar testemunho e novas formas... Hogarth? Comics! Mas, à-lá data do antigamente. Da peça citada:
Este vai para a forca...
...e este leva a taça para casa.
Industry and Idleness is the title of a series of 12 plot-linked engravings created by William Hogarth in 1747, intending to illustrate to working children the possible rewards of hard work and diligent application and the sure disasters attending a lack of both.
in Wikipedia
Aquilo dos jobs? Sobretudo, aquilo das origens: reconhece-se um parentesco à BD moderna, mas ainda em fase embrionária. Mas, e se a BD moderna é ainda uma fase embrionária de qualquer outra coisa? Qualquer outra coisa que reconhece nesta um parentesco, mas, como os engravings do WillHo, evolui para outra natureza. Se os comics modernos estão tão relacionados à tecnologias que os permitiu, e esta está em plena reinvenção, ou cremos que os comics são um beco evolutivo ou temos que aceitar que estes continuarão a transformar-se. U guys know where we going: no cruzamento de comics do antigamente com o punx do antigamente: webcomics para o amanhã! Diz-nos Fleen:
I’m Pretty Sure It’s A Webcomic. Words+Pictures, right? That’s McCloud 101, and it’s on the web …
in "Pretty sure it's a webcomic" 6 jul 2017
A propósito da "still-being-released-in-big-chunks sort-of-story, sort-of-multimedia-experiment" que está a acontecer aqui.
shit-u-not: na homepage do SBNation
"What football will look like in the future" by Jon Bois
Ou "17776", se preferirem. Muito, muito extenso -e xau aí pessoal que já partiu para o Facebook e cenas, temos pena...- muito muito complicado, e sobretudo, muito muito punk. O equivalente do fanzine eighties com a foto-montagem ranhosa, agora em multimédia. A ler com tempo e vontade para o desafio - ou vai scrollar o FB se queres simples. Artsy, tomar notas.
Any-ho, this is punk!
E, a haver moral: no future, mas a (hi)story recomeça sempre no dia seguinte.