♪ Now philosophically you'd be opposed ♪
♪ To one inhaling coke via mouth or the nose ♪
♪ But economically I would propose ♪
♪ That you go eat a dick as employment froze ♪
Como prometido vezes sem conta em inúmeros teasers antes, nos próximos tempos vamos introduzir ao debate uma outra forma de entender o $$$.
CAPÍTULO I:
“Mais fácil imaginar o fim do mundo que o fim do capitalismo”
Imediatamente MF propõe-nos a sua premissa base: somos incapazes de conceber uma alternativa económica ou política ao capitalismo, e na ausência de uma resposta / plano coerente que se lhe oponha rendemo-nos a uma espécie de esperança sem sentido quase subconsciente que nos permite coexistir com essa ideologia predatória, esvaziando-a de uma acção concreta de resistência: mesmo aqueles que o combatem assumem a inevitabilidade do Capitalismo esperando apenas conseguir aplacar as suas consequências mais nefastas.
Neste desalento geral –e, reforçamos, subliminar na sua generalidade – MF coloca um enfâse inicial na construção cultural e de identidade da nossa modernidade, questionando os mecanismos de construção desta e introduzindo – ainda na forma de conceitos apresentados primariamente neste capítulo – a sua corelação a uma certa ansiedade. Desta e perante a paralisia que nos aflige, interroga-se MF:
How can a culture persiste without the new? What happens if the young are no longer capable of producing surprises
Com o foco pelo “next big thing” substituído pelo “last big thing” – “há quanto tempo foi, e quão grande foi?” – sobre o exemplo da distopia cinematográfica “Children of Men” (*), MF encontra ecos do “The Waste Land” por T.S. Eliot, mas, sobretudo, do “Tradition and the Individual Talent”, onde antecipando-se a Harold Bloom descreve a relação reciproca entre o “canonical and the new”.
* Uma das genialidades reconhecidas de Mark F está na facilidade com que recorre a exemplos acessíveis de cultura popular para enunciar conceitos filosóficos enriçados.
Da relação novo-velho, a novidade surge como resposta ao estabelecido, por sua vez o estabelecido é obrigado a reconfigurar-se em resposta à novidade. Mas na ausência do novo somos roubados do próprio passado porque a tradição não possui qualquer legitimidade se nada a contesta ou transforma:
A culture that is merely preserved is no culture at all.
Cruzado à aparente inevitabilidade do capitalismo: parte do seu poder reside na sua capacidade de “subsumir e consumir” toda a história que o precede, criando uma equivalência de valor monetário a todos os objectos culturais e ritos que infecta transformando-os em artefactos. Nessa conversão práticas são reduzidas as objectos meramente estéticos, as crenças das culturas anteriores ironizadas. O colapso transformativo do simbólico que o capitalismo opera reduz o individuo ao papel de consumidor-espectador, “trudging throught the ruins and the relics”, e essa transformação de crença em estética, de participação em espectador surge-nos justamente como uma das virtudes do realismo capitalista porque força-nos a uma atitude de distância irónica (*) tão característico da nossa era.
* E que nos “imuniza contra as seduções do fanatismo”. Aliado a distâncias irónicas e MF poderia estar a desconstruir os P+, mas da ironia do irónico e o que nos separa dos sintomas aqui descritos no decorrer destas recensões.
Cruzando pós-capitalismo com pós-modernismo –e, por razões nossas de edição, saltando por cima das contradições de Badiou- MF recorda a descrição de capitalismo de Deleuze e Guattari como a “mais impressionante desde Marx”, “a motley painting of everything that ever was”: um sistema que não é definido por Lei, mas que a transcende, desmonta, dessacraliza, que se define e redefine ad hoc, por improviso e pragmaticamente. Que, típico MF, compara ao “The Thing” de John Carpenter, poucas linhas antes de referenciar a “sobressaturação de uma era com história” de Nietzshe ou o fim da história por Francis Fukuyama. Deste compara ao pós-modernismo de Frederic Jameson a lógica cultural do pós-capitalismo, dominada pelo pastiche e revivalismo, mas ao qual MF contrapões diversas diferenças com seu próprio conceito de realismo capitalista. Enumerando três -aquele número mágico:
- Anos 80 e Thatcher (e Reagan): antes deste ainda persistiam algumas formas de alternativa ao capitalismo, o pós-modernismo de Jameson é aplicável até esse momento. Desse ponto em diante MF prefere a designação de realismo capitalista como o mais adequado, momento que se estabelece a doutrina do “não há alternativa”, uma “deeper, far more pervasive, sense of exhaustion, of cultural and political sterility.”
- O pós-modernismo sugere uma relação ao modernismo, uma que pode possuir um potencial revolucionário (Adorno) mesmo se apenas por via das suas inovações formais, e que Jameson identifica antes na incorporação de motivos modernistas na cultura popular ou na sua absorção em comodidades que contrariam o credo modernista – elitista e top-down, em prol da “diferenciação, diversidade e multiplicidade”. MF distingue o realismo capitalista na medida que este dá por garantida a supressão da modernidade: esta já não passa de um estilo estético sem qualquer ideal de vida, um que se pode inclusive revisitar no cíclico reciclar do passado.
- Pós-muro de Berlim não existe mais uma exterioridade à qual o pós-modernismo identificado em Jameson se possa evidenciar, ao contrário das décadas de 60 e 70 que obrigavam o capitalismo a conter e absorver energias externas: o realismo capitalista não sofre ameaças de qualquer concorrência.
Comparado e diferenças assinaladas, MF sentencia mais uma daquelas frases que nOS POSITIVOS poderíamos ter levado muito a mal, não tivéssemos encontrado as nossas próprias diferenças à definição de Mark – a voltar aqui. Diz-nos ele:
The old struggle between detrournement and recuperation, between subversion and incorporation, seens to have been played out. What we are dealing with now is not the incorporation of materials that previously seemed to possess subversive potentials, but instead, their precorporation: the pre-emptive formatting and shaping of desires, aspirations and hopes by capitalist culture.
Mas se compreendemos o limite da extensão da comparação, aos nossos artsys tocas-lhes muito mais porque não conseguiram a distância:
The establishment of settled ‘alternative’ or ‘independent’ cultural zones, which endlessly repeat old gestures of rebellion and contestation as if for the first time. ‘Alternative’ and ‘independent’ don’t designate something outside mainstream culture; rather, they are styles, in fact the dominant styles within the mainstream.
Variação familiar que martelamos incessantemente e recentemente revisitamos sobre o prisma do meio em si. Yet o primeiro capítulo não termina sem outro um assalto a mais frentes dOS POSITIVOS.
Kurt Cobain, Nirvana. Já revisitado algures antes, agora a propósito dos indies alternativos.
Diz-nos Fisher das angustias de Cobain que este compreendeu a sua função como uma peça da engrenagem: “descobriu-se num mundo em que nenhuma inovação estilística é mais possível, onde apenas se pode imitar estilos já mortos” - compreendeu que passava de um cliché, mas até essa consciência era um cliché. MF exemplifica KC para implicar uma bifurcação de sentidos ao “real” –que desenvolve em capítulo posterior- dividindo-o em duas interpretações: a) autenticidade, “música sem compromissos que se recusa a vender à indústria musical ou a suavizar a sua mensagem para uma maior aceitação”; b) ou adequação à realidade como reflexo da instabilidade económica do capitalismo, um espelho da morte do social onde as corporações beneficiam da redução dos direitos do individuo.
Autenticidade e cultura sem compromissos: onde nos implicam e onde nos distanciamos: já não ouvimos um álbum de grunge ainda antes dos Mudhoney se terem tornado translúcidos, as nossas preferências seguem há anos para outras linguagens mais interventivas, especificamente, hip-hop. Coincidência – perseguem-nos!-, a tecla que MF martela imediatamente a seguir. Diz-nos Mark que o gangster rap não reflecte meramente condições sociais pré-existentes como defendem os seus defensores nem é causa dessas condições como acusam os seus críticos, antes, é um dos veículos através dos quais o realismo capitalista se trasveste num mito anti-mítico: a retórica dos rappers subscreve e promove uma realidade “como é”, uma guerra Hobessiana de todos contra todos, desprovida de qualquer ilusão sentimental. Ie, a perpetuação um sistema de exploração e criminalidade geral.
O mesmo asterisco já referido antes.
Last and least, MF afasta-se de referências musicais e termina o seu texto com espaço para uma outra terceira comparação que não podemos deixar de continuar a comparar aos P+ e tópicos que nos trespassam, conseguindo ainda largar uma nota sobre comics para ilustrar “the same neo-noir worldview” através do machismo e desmistificação de bds como as de Frank Miller.
Final de capítulo - continuamos na próxima.
Advertência / a recordar: uma intenção percorre imperceptível aos demais entre artefactos populares rendidos inócuos ante o $$$. Como Mark Fisher constrói sobre a pós-modernidade de Jameson e avança o seu conceito de realismo capitalista, nós construímos sobre o seu: alternativas coerentes são necessárias à construção de uma nova sociedade, mas não um pré-requisito incontornável à destruição da antiga. Exemplo, a propósito de putas-nazi a marchar em Charlottesville Paul Manson escrevia no final do seu artigo de opinião:
If someone is waging a culture war against you, at some point you have to fight back.
in "The far right has declared cultural war – we have to stop them now" 14 ago 2017
Correcto, mas paradigmático da distância que nos separa basta-nos o título do artigo: "The far right has declared cultural war – we have to stop them now". Now? OS POSITIVOS: em guerra cultural há 20 anos.