A pretensa aproximação entre banda desenhada e práticas artísticas ocorre com a intermitência que se adivinha em período de incerteza e timidez à valorização dos comics em instituições culturais. Esporádica e excecional, justificada com um discurso (*) de comparação às restantes artes com um decalque de linguajar que se compreende pela estranheza do exercício e insuficiência de argumentos próprios, sente-se o desconforto da legitimidade ao meio: enquanto prática textual e gráfica, a banda desenhada continua a ser uma subtração das suas partes.
* Aos críticos e académicos que pintam os comics a novas cores e lhes desenham outras linhas de percepção devemos a legitimidade almejada, e como espécime recorrente nOS POSITIVOS devemos-lhe igualmente duas notas de apreciação.
Academia: apontamos-lhe a mesma ambivalência na relação aos cómicos e suas formas. Estes últimos não procuraram encurtar a distância aos primeiros, terão sido os académicos a aproximar-se da banda desenhada pela carência de novas fontes, artefactos e tópicos a totalizar ao corpo de literatura necessária na submissão a seus pares por exigência do grau, paupérrima de originalidades entre uma comunidade cada vez mais populosa mas igualmente despovoada. Igual sinal dos tempos, a velha distinção de alta e baixa cultura prossegue a sua erosão, hierarquias desmoronam-se, quadradinhos tornam-se referências culturais e artísticas de extrema gravidade: criada a necessidade surge o mercado, a banda desenhada inflete natureza e função, a pouca distância de ambas as perturbações tropeçamos no crítico.
A crítica não é estranha à banda desenhada: este é um meio emocional capaz de arrebatar dos seus leitores as reações mais sentidas, ciosos por vocalizar as mais ínfimas particularidades da ofensa e exaltação imaginada. Mas esta é também uma crítica indiferente ao corpo teórico das restantes artes: como à academia, a banda desenhada não buscou validação fora do seu domínio, acedeu à dança após o convite que lhe foi estendido. A invasão alienígena da nova crítica que decompõe a banda desenhada dotada de ferramentas emprestadas a domínios aproximados exige da banda desenhada uma concordância a tradições históricas que não são as suas: são os próprios críticos que ainda estão por adquirir as competências necessárias à sua razão de ser, e a incapacidade em compreender a diferença a verdadeira tragédia.