A BD e arte contemporânea partilham de inquietações similares. Autores na primeira aproximam-se de preocupações conceptuais dos segundos, estes informam-se das tradições dos primeiros. A desconfiança persiste e a diferença que os separa o valor dos comics.
A arte por baixo possui uma longa tradição, particularmente importante em princípios de identidade, uma que também resulta da partilha de referências e códigos estéticos além dos costumes e práticas. Se a banda desenhada acumula capital cultural suficiente para requerer uma legitimidade maior entre as restantes artes, importa-nos que a) não se importe muito com isso b) o mereça porque os usos que dessa se faz e com ela o façam aconteça por apropriação de baixo para cima, não rarefação de cima para baixo.
Perdoem-nos o essencialismo, mas o nosso pecado é mesmo a reivindicação de uma autonomia própria à BD.
Da nossa parte, porque demasiadas vezes é esquecido ao debate, recordamos a importância da sua relação à tecnologia. Compreendam-me, fala-vos o anarcho-primitivista: numa sociedade inteiramente pastoral não nos apanhavam a perder tempo com rabiscos de bd. Ignoremos o óbvio - os comics não teriam surgido numa realidade estranha à comunicação de massas – e consideremos o provável: mesmo de regresso à pastorícia em modo pós-apocalíptico e dotados do conhecimento prévio da possibilidade de banda desenhada, ela seria um péssimo empreendimento que a ruína do esforço necessário renderia inútil, abandonado logo na própria geração ainda recordada dos Patinhas que liam em puto antes do Trumpas puxar do botão. Todos aqueles que hoje divagam em desenhos partiriam para a pintura ou para a literatura, exercícios solitários mais proveitosos à introspecção do que sequenciar pinturas e textos com métodos artesanais sem pressuposição de leitura por Outro(s). E, claro, aqueles que hoje desenham por $$$ seriam os primeiros a mandar a bonecada pastar – desses estamos conversados.
Circa séc. XXI, webs-et-dígitos e canais de distribuição audiovisuais e textuais que rodam várias vezes o mundo num só dia, a banda desenhada é parte integrante de um arsenal contra-a-cultura. Podemos, devemos, questionar que formas toma a banda desenhada enquanto meio de expressão e comunicação numa sociedade pós-industrial.
À nossa significação em Autenticidade na banda desenhada vemos-mos assim na necessidade de discutir esta arte com “a” pequeno sem bolinha ante uma Arte dita maior, um debate difícil que nos obriga à desambiguação implicada mais premente: serão os comics, arte?
Obrigados então.